Consaguinidade amorosa

Meu avô paterno costumava dizer que amigo é a família que a gente escolhe. Ao longo da minha vida fui me dando conta que vamos tecendo relações familiares também com instituições que comungam nossos valores e crenças. O escritor Francisco Azevedo ressalva que família é prato que deve ser servido sempre quente, quentíssimo, pois uma família fria é insuportável, impossível de se engolir. Inspirada pela imagem que essa frase desperta, encontrei na ATF-RJ uma família que me manteve muito bem alimentada com iguarias na brasa servidas com sabedoria. Uma família institucional a qual tenho a felicidade de fazer parte desde 2017.

A ATF-RJ nos dá o apoio necessário para compartilharmos nossos projetos e iniciativas ousadas.

Durante os primeiros meses da pandemia, vivemos momentos extremamente difíceis. A rotina foi invadida e modificada à nossa revelia. Se o medo e a incerteza penetraram na nossa intimidade, também catalisaram processos de criatividade.  

De acordo com o inspirado escritor, receita de família não se copia, se inventa. E a ATF-RJ inventou! Ela criou um belo movimento para acolher as famílias e os casais que estavam atravessando momentos de intensa turbulência no confinamento imposto pelo momento que vivíamos.

Fazer parte da família ATF- RJ foi de fundamental importância para o trabalho que vinha coordenando desde o dia 22 de março de 2020, o Time Humanidades. Formamos um time com mais de noventa psicólogos, onze psiquiatras e duas advogadas, que se originou a partir do grupo Humanidades na Saúde – liderado pelo Dr. Ricardo Cruz, no Hospital Samaritano. Oferecemos um suporte psicológico através de um atendimento pontual online para ajudar os profissionais da saúde e a população em geral.

Ao longo desses quase dois anos de existência, as redes de conversa e o grupo de enlutados foram novas modalidades de assistência ofertadas.  

Durante os primeiros meses do nosso trabalho, fizemos vários acolhimentos que revelaram a desarmonia familiar. A dificuldade em dar conta do isolamento, das crianças trancafiadas em casa, dos desafios da convivência aguçaram as zonas de conflito.  Algumas famílias atingiram o ápice do risco com casos de violência doméstica. A tessitura desse trabalho fortaleceu o grau de parentesco com instituições preciosas que nos ajudaram em situações fundamentais. A ATF-RJ foi uma delas. Os laços, gerados pela consanguinidade amorosa nos proporcionaram uma proximidade com Rosane Porto e Vera Risi, incansáveis em tecer pontes que viabilizavam o atendimento solicitado. E das queridas Rosane Esquenazi, Silvia Vaks, Maria Tereza Maldonado, Lia Ganc, Ana Cristina Barros Fróes, Cassia Zanini, Elizabeth Salgado, Eva Bruckner, Marcia Merquior, Tamara Louro, Danielle Grynszpan e do bendito ao fruto José Roberto Muniz que passaram também a fazer parte do nosso Time Humanidades.

A solidariedade e a empatia expressaram a sintonia do nosso encontro. Tecemos redes que embalaram e acolheram histórias pelo Brasil afora.

A Família é prato que emociona, como nos diz Azevedo. Nós vivemos nesses tempos sensíveis, alimentados pela beleza da generosidade, amparados pelos valores que legitimavam nossa consanguinidade. Com respeito e delicadeza ampliamos a degustação de novos pratos inspirados.  

Nos momentos intensos da pandemia, afinidade fortaleceu nossos laços. Graças a eles, criamos possibilidades na adversidade. Somos uma família que até hoje aproveita e valoriza as riquezas dos ingredientes partilhados. Construímos uma mesa farta, repleta de amor, compaixão e criatividade. Ela continua bem-posta, aberta a quem quiser se chegar.

Referência bibliográfica: Azevedo, F. 2017- “Arroz de Palma” – Editora Record – Rio de Janeiro

Ana Luiza Novis

Psicóloga Clínica, terapeuta de família, especialista em saúde mental infanto-juvenil PUC-RJ , escritora Coordenadora do Time Humanidades e do Projeto Social Papo com Zero, Associada Titular da ATF-RJ