Na minha família, desde muito pequeno, aprendi a expressar o amor através do cuidado para com as pessoas. Não éramos de amores explícitos nas falas, mas nos sentíamos amados no nosso modo de conviver.
Neste momento, passados mais de sessenta anos, minha história se reformula mais uma vez e a vida me dá a oportunidade de trabalhar terapeuticamente com as falas e as expressões dos sentimentos das pessoas.
Minha formação acadêmica e minha trajetória profissional já percorreram muitos caminhos em diferentes espaços, mas foi na Educação que estabeleci lugar e território.
Falo de lugar como um espaço que ganha e oferece sentido, e foi isso que o trabalho nas escolas me possibilitou. E falo de território porque foi um espaço que pude ocupar coletivamente, com minhas diferentes tribos…
Nas escolas por onde passei, fui professor da educação básica e superior, coordenei atividades comunitárias e exerci tarefas de gestão, ao longo de quase cinquenta anos. Nessas funções, sempre tive a oportunidade de lidar com as famílias dos alunos e com o acompanhamento dos profissionais das escolas. E ouvi, muitas vezes, a sugestão dos colegas, no sentido de trabalhar diretamente com o atendimento de famílias.
Ao perceber que meu tempo nas escolas estava se encerrando, resolvi aceitar essas sugestões e busquei a formação em Terapia Sistêmica de Famílias do CEFAI[1] do Rio de Janeiro. Em certo sentido, foi uma aproximação natural, pois a perspectiva sistêmica já era o meu modo de trabalhar, desde que comecei a estudá-la, ainda de modo assistemático, nos anos 1980.
Desde aquela época, procurei agir com aquele olhar e nele pude fundamentar minha atuação nos trabalhos que publiquei e em diferentes projetos educacionais que buscavam alternativas aos modelos tradicionais de escola.
Meu Trabalho de Conclusão de Curso tratou da relação Escola-Família e de um tema que venho estudando há alguns anos, que são os saberes parentais. Nele, procurei analisar a Escola como espaço para trocas de saberes e as Famílias como geradoras de saberes que poderiam ser compartilhados em atividades colaborativas.
Esse trabalho veio completar meus estudos de Mestrado e Doutorado, nos quais me dediquei, respectivamente, a estudar o protagonismo dos alunos e o papel dos gestores na criação de um ambiente no qual os docentes pudessem dar sentido e significado ao seu exercício profissional.
No CEFAI, fiz parte da turma de 2017, constituída por colegas de diferentes origens profissionais e trajetórias pessoais. No meio deles e delas, com as suas contribuições e as orientações da equipe formadora, fui dando os primeiros passos na aplicação do olhar sistêmico ao trabalho terapêutico com as famílias.
Estou em processo de formação permanente, e isso não é força de expressão, pois me mantenho em diferentes Grupos de Estudo, participando das atividades formativas do CEFAI e da ATF-RJ e aproveitando o lado bom do isolamento pandêmico que são as muitas transmissões de cursos e palestras pela internet, no meio das quais vamos descobrindo verdadeiras joias elaboradas pela generosidade de muitos profissionais.
Iniciei os atendimentos terapêuticos supervisionados e em equipe, ainda durante a formação e, em seguida, individualmente ou em duplas, passei a ter minha clientela, a partir da Clínica Social do CEFAI e da Associação de Terapia de Família do Rio de Janeiro (ATF-RJ). Eles têm sido um permanente espaço de aprendizagem através da escuta e da curiosidade que cada caso me desperta.
Tenho muito pouco tempo para falar de um “delapraca” entre minha formação e minha atuação como terapeuta de família. Mas, quando penso num “delapraca”, desde o meu tempo de criança pequena, imagino que a minha família de origem estaria muito feliz. Não apenas em perceber que continuo tentando cuidar das pessoas como sinal de amor por elas; mas em ver que, de tanto escutar as pessoas falando dos seus amores, dei um passo além e aprendi a falar dos meus…
[1] Centro de Estudos da Família, Adolescência e Infância.
Artur Motta
Educador e Terapeuta Sistêmico de Famílias